O recém publicado trial INVICTUS avaliou a utilização de rivaroxabana em pacientes com fibrilação causada por doença cardíaca reumática. Este estudo foi apresentado no último congresso da Sociedade Europeia de Cardiologia – ESC 2022 em Barcelona e publicado simultaneamente no New England Journal of Medicine.

De acordo com este estudo a utilização de rivaroxabana (inibidor do fator Xa) associou-se a um risco 25% maior de AVC, embolismo sistêmico, infarto do miocárdio ou morte por causa vascular ou causas desconhecidas – o desfecho primário de eficácia – quando comparado com antagonistas da vitamina K (VKA), uma diferença dirigida principalmente por aumento de morte e AVC isquêmico no grupo rivaroxabana.

Base teórica:

Em ensaios clínicos randomizados de fibrilação atrial não valvar, DOACs provaram ser tão efetivos quando comparados com varfarin, com menor risco de hemorragia intracraniana. No estudo Rocket AF, rivaroxabana mostrou-se não inferior a varfarin para prevenção de AVC ou embolismo sistêmico, sem diferença no risco de sangramento maior entre os dois grupos, mas com menor taxa de sangramento intracraniano e fatal.

Paciente com AF reumática diferem dos pacientes com FA não valvar por serem mais jovens e mais frequentemente mulheres e frequentemente apresentarem-se com doença valvar avançada, particularmente estenose mitral.

Doença cardíaca reumática afeta 40 milhões de pessoas no mundo, com cerca de 20% dos pacientes que são sintomáticos apresentando AF e elevado risco de AVC. Apenas metade dos pacientes com AF associada à doença cardíaca reumática são tratados com VKA. Entre os pacientes tratados, apenas 1/3 estão com INR dentro do alvo terapêutico.

Desenho do estudo:

4.565 pacientes com AF/flutter e doença cardíaca reumática documentada provenientes de 24 países foram arrolados (média de idade 50,5 anos; 72,3% mulheres) (2292 no grupo rivaroxabana e 2273 no grupo VKA). A análise intention-to-treat incluiu 4531 pacientes (2275 no grupo rivaroxabana e 2256 no grupo VKA).

Para serem incluídos, os pacientes deveriam apresentar 1 dos seguintes critérios: CHA2DS2-VASc score de pelo menos 2; estenose mitral com área < 2.0 cm2; ou ecocardiograma com evidência de contraste espontâneo no átrio esquerdo ou trombo no átrio esquerdo.

No total, 85% dos pacientes tinham estenose valvar mitral, a maioria classificada como moderada ou grave.

Dose: rivaroxabana 1x ao dia (20 mg ou 15 mg, de acordo com a função renal); VKA dose ajustada pelo IN (alvo 2.0-3.0)

Follow-up médio: 3,1±1,2 anos.

Desfechos:

Desfecho primário de eficácia: desfecho composto de AVC, embolismo sistêmico, infarto do miocárdio, morte por causa vascular (cardíaca ou não cardíaca) ou de causa desconhecida.

Desfecho primário de segurança: sangramento maior

Resultados:

Desfecho primário de eficácia: 560 eventos no grupo rivaroxabana vs. 446 eventos no grupo VKA (HR 1,25; IC 95% 1,10-1,41) (intention-to-treat analysis)

Morte: rivaroxabana aumentou risco em 23% (tempo médio de sobrevida: 1608 dias vs. 1680 dias; diferença −72 dias; IC 95% −117 a −28 dias; mortes: 552 no grupo rivaroxabana vs. 422 no grupo VKA)

AVC: rivaroxabana aumentou risco em 37% (90 pacientes vs. 65 pacientes) (diferença −21; IC 95% −40 a −2)

Sangramento maior, ameaçador à vida ou clinicamente relevante e sangramento intracraniano: sem diferença

Sangramento fatal: menos comum com rivaroxabana (4 vs. 15 eventos)

Descontinuação do tratamento: mais comum em pacientes tratados com rivaroxabana (23% vs. 6%).

Nível de INR: varfarin era utilizada por 52,8% dos pacientes anteriormente ao início do estudo com apenas 33,2% dentro do alvo. Após início do estudo, INR estava no alvo em 56,1% dos pacientes aos 6 meses, 59% com 1 ano, 65,3% com 2 anos, 65,1% com 3 anos, 64,1% com 4 anos.

Conclusão:

Diante destes achados, VKA deve permanecer o tratamento de escolha em pacientes com fibrilação atrial reumática.

Referência:

Connolly SJ, Karthikeyan G, Ntsekhe M, et al. Rivaroxaban in Rheumatic Heart Disease-Associated Atrial Fibrillation [published online ahead of print, 2022 Aug 28]. N Engl J Med. 2022;10.1056/NEJMoa2209051. doi:10.1056/NEJMoa2209051

INVICTUS trial